A primeira etapa da proposta de reforma tributária apresentada pelo governo Bolsonaro em julho, que deve ser analisada pelo Congresso em 2021, tem entre os opositores em Brasília (DF) a irmã de Paulo Guedes, ministro da Economia e um dos autores do projeto.

Elizabeth Guedes é presidenta da Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), responsável pela campanha “Não à custa da educação”, que alerta para a possibilidade de aumento no custo das mensalidades em caso de implementação da proposta.

Estima-se que a criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), resultado da unificação entre PIS e Cofins, provocará um aumento de mais de 6% nas mensalidades de escolas e faculdades particulares.

Segundo a proposta de Paulo Guedes, o imposto que varia hoje entre 3,65% e 9,25%, a depender do faturamento da empresa, teria um valor fixo de 12%.

Elizabeth não faz parte do campo progressista e é conhecida por elogios à gestão do Ministério da Educação (MEC) no governo Michel Temer (MDB) e ao ex-ministro da Cidadania bolsonarista Osmar Terra (MDB).

A postura conservadora e privatista faz com que seu posicionamento seja coincidente com o do irmão na maioria das pautas. A proposta de reforma tributária, no entanto, “empurrou” a presidenta da Anup para a ala opositora.

Em entrevista ao Brasil de Fato, Élida Elena, vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE) ressaltou o risco de aumento da evasão em caso de reajuste das mensalidades. “[A criação do CBS] é uma política conduzida pelo governo Bolsonaro que retira direitos, principalmente dos mais pobres, e é claro que também tem impacto na educação”, enfatizou a estudante.

Os materiais de divulgação da campanha da Anup seguem a mesma linha e apontam para o risco de “exclusão de estudantes, fechamento das escolas, demissões de professores e funcionários, fim do Prouni [Programa Universidade Para Todos] e da esperança de um futuro melhor para quem mais precisa.”

A proposta de reforma tributária defendida pelo Ministério da Economia prevê o fim da isenção fiscal das bolsas oferecidas pelo Prouni, elevando a carga tributária de 0,8% para 8,8%. Além disso, não taxa os mais ricos e onera toda a cesta básica.

O argumento do governo em defesa da CBS é seu caráter não-cumulativo. Hoje, os impostos são cobrados sobre as receitas e faturamentos de empresas e se acumulam nas diferentes etapas da cadeia de produção e comercialização. Com a mudança, o ministro da Economia afirma que o processo se tornaria “menos oneroso”.

Ponta de lança

Desde que o projeto de unificação do PIS e do Cofins foi apresentado por Paulo Guedes, Elizabeth debateu com parlamentares, publicou artigos e emitiu opiniões contundentes contra a reforma – que, segundo o governo, terá outras três etapas.

Em uma das ocasiões, ela foi uma das 20 participantes de uma videoconferência com o irmão Paulo Guedes para debater o tema, ainda em julho.

“O aumento de alíquota vai aumentar o fosso entre a qualidade de ensino do Brasil e a de outros países”, disse Elizabeth em 25 de setembro, em uma audiência remota realizada pela Comissão Mista Temporária da Reforma Tributária.

No mesmo mês, ela integrou um grupo de cerca de 20 executivos de grandes grupos de ensino superior e representantes do setor que se reuniu novamente com Paulo Guedes para expor suas demandas.

A reunião ocorreu duas semanas após a publicação de um dos artigos mais contundentes de Elizabeth Guedes, que critica diretamente o governo e cita a ameaça de fechamento de ao menos 30% das 2.232 instituições de ensino superior do país.

“O mais preocupante é que até o momento o governo não demonstra estar aberto ao diálogo”, escreveu a presidenta da Anup. “Chega a ser irônico que um governo que diz que está sem dinheiro vai se dar ao luxo de exterminar um setor que arrecada (…) cerca de 21 bilhões em impostos.”

As pressões da irmã e de outros representantes do setor de serviços parecem provocar efeitos sobre o ministro, que às vésperas de 2021 sinalizou a possibilidade de baixar a alíquota da CBS de 12% para 10%, ou propor uma alíquota especial reduzida para saúde, educação e transporte.

Cerca de 81% dos estudantes das universidades privadas brasileiras estão nas classes C, D e E, com renda familiar de até três salários mínimos. Destes, 41% estão nas classes D e E, com renda de até um salário mínimo.

As outras três etapas da reforma tributária prometida pelo governo são, respectivamente: simplificação do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI), mudanças nas regras do Imposto de Renda (IR) e desoneração das folhas de pagamento das empresas.

Para compensar as perdas, a equipe econômica avalia a criação de um imposto sobre transações financeiras eletrônicas, chamado pelos críticos de “nova CPMF”.

Brasil de Fato entrou em contato com a Anup e propôs uma entrevista com a presidenta Elizabeth Guedes. Não houve retorno.

 

Fonte: Brasil de Fato