Durante debate realizado pela Comissão Especial para Avaliação dos Impactos da Pandemia da Covid-19, no dia 31 de março, médicos mostraram preocupação quanto às sequelas da doença.

Em audiência pública realizada, no dia 31 de março, pela Comissão Especial para Avaliação dos Impactos da Pandemia da Covid-19 da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA), presidida pelo deputado Angelo Almeida, o médico cardiologista André Almeida, mestre e doutor em Medicina Interna pela Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública, falou sobre as “Sequelas Cardiovasculares Devido à Infecção pela Covid-19. Diante de um questionamento da médica e professora Eliane Azevedo sobre a possibilidade de uma síndrome pós-Covid-19, André mostrou-se preocupado e afirmou que é uma hipótese que infelizmente já vem se confirmando.

O Brasil passa de 13 milhões de casos confirmados de Covid-19 e 330 mil mortes. Os dados apontam ainda cerca de 11 milhões de curados em todo o país. Mas, o que alguns estudos já vêm constatando é a grande quantidade de pessoas contaminadas pelo coronavírus e consideradas curadas, desde as que precisaram de internamento até as que não tiveram quaisquer sintomas, que apresentam sequelas devido à infecção pela doença.

Na ocasião, a professora Eliane explicou que embora não seja especialista na área, já que é geneticista por formação, acompanha os avanços científicos relacionados à pandemia e cogitou a possibilidade de estar existindo uma síndrome pós-Covid-19 ao fazer analogia à síndrome pós-pólio, que acomete 20% das pessoas que tiveram poliomielite, como é o caso dela. “Na síndrome pós-pólio existe restos virais que desencadeiam sintomas anos após a fase aguda. Atualmente, cresce o número de relatos de pacientes com persistência de sintomas da Covid-19, mesmo após a fase aguda. Esses sintomas podem ser vistos como sequelas passageiras ou não”, afirmou.

André Almeida disse que as sequelas da Covid-19 são uma realidade e que diversos grupos de pesquisa iniciaram estudos sobre o assunto. A revista inglesa British Medical Journal (BMJ) publicou recentemente resultado de uma pesquisa na qual foram avaliadas 47.780 pessoas que tiveram Covid-19 na Inglaterra. Todas foram internadas e receberam alta hospitalar até o dia 31 de agosto de 2020. No início de 2021, os pesquisadores procuraram avaliar o que tinha acontecido com essas pessoas: constataram que 5.875 (12,3% do total) morreram e que 29,4% voltaram a ser internadas devido a complicações associadas à doença.

Esses resultados foram comparados com um banco de dados composto por cerca de 50 milhões de pessoas que não tiveram a Covid-19 no Reino Unido. Neste banco de dados, a mortalidade, no mesmo período, foi de apenas 1,7% e a taxa de internação foi de 9,2%.

“Nesse trabalho, os autores identificaram um grupo de pessoas de alto risco para morrer e um grupo de pessoas de alto risco para voltar a ser internados devido às complicações da Covid-19. Dos 47.780 que estiveram internados, 14.140 (29,6%) apresentaram doenças respiratórias após a alta hospitalar. Já no grupo controle, que não precisou de internamento, só 5,4% tiveram doenças respiratórias no mesmo período. Isso sinaliza, de forma muito clara, que essas pessoas que tiveram a Covid-19 formam um grupo de alto risco para apresentarem complicações após a doença e preenchem os critérios que permitem caracterizar a síndrome pós-Covid-19”, esclareceu André.

A professora Eliane Azevedo acredita que apenas um percentual das pessoas que tiveram a Covid-19, em estágio grave ou leve, apresentará persistência dos sintomas. Porém, alerta que essa é apenas uma das muitas perguntas que a ciência ainda precisa responder. “Somente o tempo, o acompanhamento e os cuidados dos pacientes que tiveram a Covid-19 trarão respostas sobre o comportamento desse vírus a longo prazo”, frisou.

André destaca que existe uma grande preocupação com os sintomas da Covid-19 enquanto o indivíduo está na fase aguda da doença e, principalmente, quando está internado. “É lícita essa preocupação, visto que a taxa de letalidade da doença no Brasil é alta: cerca de 2,5% dos infectados estão morrendo em consequência da Covid-19. Mas existem outras preocupações tão importantes quanto essa. Por exemplo: quais as consequências que a Covid-19 vai deixar na vida dessas pessoas? Como será a qualidade de vida daqueles que sobreviverem à Covid-19?”, questionou.

“É fundamental que voltemos os olhares para esses pacientes que estão saindo do internamento e, também, para os que tiveram a Covid-19 e não precisaram ser internados. Essas pessoas podem, com o passar do tempo, apresentar sintomas como dor de cabeça, dor nos músculos, fadiga, falta de ar, dores nas articulações, dor no peito, tosse e outros achados que, no contexto, caracterizam uma síndrome. Assim como temos a síndrome pós-pólio, aqui passamos a ter a síndrome pós-Covid-19”, afirmou André.

Estudo com atletas

Em recente estudo feito nos Estados Unidos, ainda de acordo com o cardiologista, pesquisadores acompanharam 26 atletas universitários que tiveram Covid-19. Todos eles na forma assintomática da doença ou apenas com sintomas leves, que não levaram à internação. Após a realização da ressonância magnética do coração, ficou constatado que 15% estava com miocardite, uma inflamação no coração, e 30,8% apresentavam uma cicatriz no órgão.

“Isso deixa os médicos e pesquisadores muito preocupados porque, provavelmente, esses achados também podem fazer parte da síndrome pós-Covid-19 e estão sendo muito pouco identificados. Conforme dito, existem questões que precisam ser respondidas, tipo: O que vai acontecer com esses jovens a longo prazo? Será que essas cicatrizes no coração trarão danos tardios ao portador? A medicina ainda não tem as respostas para essas questões”, pontuou André.

O cardiologista ressaltou a importância do acompanhamento médico pós-Covid-19. Segundo André, existem formas de investigar se o indivíduo ficou com alguma sequela. Além da avaliação clínica, há alguns exames que podem ser necessários, entre eles o eletrocardiograma, o ecocardiograma e a ressonância magnética do coração. O médico cardiologista irá indicar o exame mais adequado ao paciente.