ANÁLISE

O valor de mercado da Apple ultrapassou o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil ao longo da semana. Sobre isso, a Sputnik Brasil ouviu a economista Juliana Inhasz, professora do Insper, que pondera sobre se é correto comparar as cifras e explica que a diferença aponta que o Brasil precisa se desenvolver.

Na terça-feira (6), a Apple alcançou valor de mercado de US$ 1,88 trilhão (cerca de R$ 10,22 trilhões). A marca supera o PIB do Brasil registrado em 2019, de US$ 1,84 trilhão (R$ 10 trilhões), conforme apontam os dados compilados pelo Banco Mundial.

A economista Juliana Inhasz, professora e coordenadora de graduação em Economia do Insper, chama a atenção para o fato de que os valores, apesar de impressionantes quando comparados, são calculados de formas diferentes. No caso do valor da empresa, a economista explica que o cálculo leva em conta não só a capacidade de produção, a capacidade administrativa e os ativos da companhia.

“Mais do que isso, os acionistas também levam em consideração – acionistas e investidores, é óbvio – o quanto essa empresa apresenta de perspectivas de lucro e resultados futuros”, explica a professora em entrevista à Sputnik Brasil, apontando que o valor da empresa é também uma expectativa.

Já no caso do PIB dos países, a conta leva em consideração outro conjunto de fatores, que conformam o que um determinado país conseguiu produzir ao longo de um ano.

“[No PIB] a gente está olhando aquilo que o Brasil conseguiu produzir em bens e serviços que foram alocados: para consumo, seja privado ou público; para investimento, seja privado ou público; ou destinados à exportação dentro de um determinado período de tempo, no caso, o ano”, aponta.

Mulher passando por logotipo vermelho da Apple em Pequim, China
© AP PHOTO / NG HAN GUAN
Mulher passando por logotipo vermelho da Apple em Pequim, China

A economista explica que perspectivas futuras também impactam no cálculo do PIB, mas de forma distinta do que ocorre no valor de mercado das empresas. As perspectivas alimentam investimentos na estrutura produtiva de um país, o que estimula o PIB.

“A gente não coloca na conta do PIB brasileiro, hoje, o quanto a gente acha que vai produzir amanhã. Então, a nossa perspectiva de crescimento amanhã não valoriza a nossa produção hoje. Ela pode ter um impacto no nosso investimento, mas ela não tem a capacidade de supervalorizar a nossa produção hoje, o que pode acontecer sim com empresas como a Apple, com suas ações”, aponta.

Movimentação nas ruas e comércio nos arredores do Mercado Popular do Saara, no centro do Rio de Janeiro, durante a pandemia da COVID-19, em 10 de julho de 2020.
© FOLHAPRESS / FERNANDO SOUZA / AGIF
Movimentação nas ruas e comércio nos arredores do Mercado Popular do Saara, no centro do Rio de Janeiro, durante a pandemia da COVID-19, em 10 de julho de 2020.

A professora Inhasz deixa claro que, por esses fatores, não é possível comparar os valores do PIB de um país como o Brasil com o valor de mercado da Apple. No entanto, a economista aponta que os valores absolutos postos lado a lado mostram que o Brasil ainda precisa se desenvolver em áreas como a tecnologia para abrigar empresas do porte da Apple.

“A gente precisa, de fato, de mais tecnologia na economia brasileira, de mais inovação, para que as nossas empresas possam crescer. Porque se a gente tiver empresas nacionais que cresçam, se desenvolvam e tenham prosperidade, assim como a Apple, daqui a um tempo a gente também vai ter um PIB maior”, aponta.

Valorização da tecnologia na pandemia e recuperação econômica do Brasil

O crescimento do valor de mercado da Apple também coincide com a grave crise econômica em meio à pandemia do novo coronavírus. Enquanto a perspectiva do PIB do Brasil despenca e pode registrar queda de 9,1%, segundo dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), algumas empresas de tecnologia como a Apple viram seu valor crescer.

“A gente percebe que, nesse período de pandemia, as empresas de tecnologia estão sim, na média, crescendo. Isso acontece porque, nesse momento tão complicado que a gente vive, a gente foi obrigado a ficar dentro de casa e ter que se virar para trabalhar de dentro de casa, para viver uma vida diferente da que a gente estava acostumado. Então a gente teve que se adaptar tecnologicamente a um novo contexto”, explica a professora, que aponta que as pessoas passaram a gastar mais com produtos eletrônicos, beneficiando empresas como a Apple.

Ato da ONG Rio de Paz sobre as 100 mil mortes por COVID-19 no Brasil, na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, em 8 de agosto de 2020.
© FOLHAPRESS / FELIPE DUEST
Ato da ONG Rio de Paz sobre as 100 mil mortes por COVID-19 no Brasil, na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, em 8 de agosto de 2020.

A professora Juliana Inhasz destaca ainda que, com as expectativas da economia brasileira em baixa, a esperança de recuperação econômica segue atrelada ao controle da pandemia no país.

“É difícil a gente criar um prognóstico de quando as coisas aqui vão começar a melhorar. Porque a gente depende muito de uma redução dessa aceleração do número de casos, a gente depende muito de como as pessoas reagem a essa incerteza que ainda é tão grande dentro da população. A gente ainda precisa que as pessoas tenham mais confiança para voltarem a circular, voltarem a consumir para que isso então comece a reativar setores produtivos”, avalia.

Sputnik