Por Felipe Bianchi/Barão de Itararé – Foto Eduardo Tito

Laurindo Leal Filho, Cynara Menezes e Leandro Fortes participaram de bate-papo mediado por Ivanilda Brito no Seminário “Os desafios da comunicação numa era de desinformação e ataques à democracia”, nesta quinta-feira (1), em Salvador/BA.

Um dos grandes temas do debate político nacional em 2023, a regulação de plataformas como o Google e o YouTube foi abordada por Paulo Pimenta, ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom/PR) durante o Seminário “Os desafios da comunicação numa era de desinformação e ataques à democracia”, nesta quinta-feira (1), em Salvador/BA. “O debate do PL 2630 tem a ver com o futuro da democracia, com o futuro do Brasil. Não podemos nos curvar, sob hipótese alguma, ao modelo de negócio das big techs”.

Apesar de ter ganho mais relevo após a tentativa frustrada de golpe de Estado do dia 8 de janeiro, quando hordas de ultradireita tomaram a Praça dos Três Poderes, em Brasília/DF, financiados por empresários bolsonaristas, o assunto já tramita há cerca de três anos na Câmara dos Deputados, na forma do Projeto de Lei 2630 – o chamado “PL das Fake News”.

“Hoje, qualquer país do mundo discute projetos de regulação para as plataformas. Elas não são simples meios de comunicação. Plataformas chegam a dominar 90% das buscas no mundo, coletando quase todas as informações sobre nós. É uma questão de proteção”, explica Pimenta. “Quando esse debate é travado na Europa, ninguém chama de censura. O Brasil não pode ser o país onde impera a vontade das plataformas. Regulá-las é defender a democracia”.

O ministro da Secom recorda a onda de violência e assassinatos nas escolas, em abril deste ano: “No dia dos ataques à escola tiramos 500 sites do ar, em parceria com governos e prefeituras, pois exaltavam o nazismo e a violência, a pedofilia, o racismo e a homofobia”, relata. “Também vale ressaltar que existe uma relação direta entre desinformação e as mortes durante a pandemia no Brasil”.

Comunicação do governo

“Nosso desafio é que a maioria da população entenda a realidade do Brasil”, defende Pimenta. “De todos os programas que lançamos até agora, o único que realmente chegou ao povo foi o Bolsa Família. Todos os demais vão chegar. O primeiro desafio foi mostrar ao Brasil e ao mundo que o Brasil voltou”, explica, em tom de resposta às críticas comuns nas redes sociais sobre uma certa “letargia” na comunicação do governo.

“Não seremos o gabinete do ódio às avessas. Ganhamos uma eleição para governar para todos, não só para quem pensa como nós. Não vamos fazer comunicação somente para lacrar, para ganhar like”, argumenta.

O ministro aproveitou para anunciar que a Secom deve publicar um decreto ainda em junho para integrar as rádios comunitárias às mídias do Governo Federal, a fim de que recebam apoio.

Ausência do contraditório

Professor aposentado da Universidade de São Paulo, coordenador do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de ItararéCentro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé e conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Laurindo Leal Filho, o Lalo, avalia que há um descompasso entre a política e a comunicação com o cidadão de que as melhorias em sua vida são resultados de políticas públicas. “Precisamos ter estratégias de comunicação que enfrentem esses problemas”, sentencia.

Não é só a comunicação governamental, no entanto, que preocupa Lalo. Há 50 anos na luta pela democratização dos meios de comunicação, conforme relata, Lalo revela forte desconforto com a danosa falta de regulação sobre o setor.

“Lula fez um encontro histórico com diversos mandatários sul-americanos nesta semana, recolocando em pauta as ações e mecanismos de integração e desenvolvimento na região. Algo histórico. Mas a mídia só fala de Nicolás Maduro, que é ditador e outros mantras”, dispara. “Para a mídia, o Congresso da Venezuela é corrompido. Mas não é corrompido o Congresso brasileiro, com a bancada do boi, da bala e da bíblia. Esse é um exemplo claro da necessidade da regulação. Não é sobre cassar a Rede Globo, mas abrir espaço ao divergente, promover a pluralidade”.

Esse ambiente mais diverso, segundo Lalo, abarcaria as mídias alternativas e independentes, mas também as emissoras públicas e comunitárias, por exemplo. “Apesar de contrariar até a Constituição, no Brasil, as concessões públicas de radiodifusão parecem ter donos definitivos. São concessões que se renovam automaticamente, sem nenhum escrutínio da sociedade. Isso gera um desentendimento sobre o que é uma concessão pública, o que é o direito à comunicação”.

O papel e a luta da mídia independente

De acordo com a jornalista Cynara Menezes, o desafio das mídias independentes é comunicar melhor e de forma mais ampla. “Falamos muito sobre furar a bolha, o que é, de fato, um grande desafio. O cidadão está à mercê não só da desinformação, mas também da voz única dos meios hegemônicos – que muitas vezes também desinformam”, salienta.

Para a editora do site Socialista Morena, “quando o jornalismo só reflete as classes dominantes, peca por não falar dos problemas do povo. E é isso que a gente faz na mídia independente”.

Já Leando Fortes anuncia, em tom sarcástico: “Vou discordar de quase tudo”. Para o jornalista e escritor, “não estamos discutindo comunicação; estamos discutindo luta de classes”.

Para ele, “discutir dialeticamente a comunicação é a única forma capaz de nos dar as respostas que buscamos. Precisamos controlar e fiscalizar os algoritmos, que são mecanismos que definem os rumos do mundo”.

“Nossa luta”, sublinha Fortes, “é contra as classes dirigentes e dominantes no Brasil. Nossa burguesia sequer pode ser chamada de nacional; é uma burguesia interna”.

Esses agentes econômicos e políticos dominam a mídia no Brasil, conforme denuncia o jornalista. “Quem domina, hoje, a mídia no Brasil é o sistema financeiro. Eles não estão interessados em comunicação. Eles estão interessados no negócio”, critica.

“Para ser jornalista é preciso ter alguma conexão com a realidade. Por isso acredito que é preciso voltar nossas atenções para as periferias. Há uma indigência explícita no jornalista médio brasileiro de hoje. Só na periferia poderemos criar comunicadores com os pés na realidade. Não há como interpretar a realidade vivendo somente em redes sociais, ‘achando’ como as coisas funcionam”.

Sobre o Seminário

Nos dias 1 e 2 de junho, Salvador/BA recebe o Seminário Os desafios da comunicação numa era de desinformação e ataques à democracia, promovido pelo Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé. 100% gratuito, o evento tem como proposta discutir a conjuntura política atual do país, as ameaças à democracia e os desafios colocados no campo da comunicação: o combate à desinformação, a necessidade da regulação das plataformas, comunicação pública, entre outros. O Seminário conta com o apoio do Governo do Estado da Bahia.

O Barão de Itararé atua há 13 anos na luta pela democratização da comunicação no Brasil, promovendo cursos, debates e seminários de formação, formulação e reflexão sobre diversos temas como o fortalecimento das mídias independentes, a comunicação pública e a defesa da comunicação como um direito humano. Após quatro anos de escalada da violência contra jornalistas e de ataques à liberdade de imprensa e de expressão, é hora de discutir experiências e estratégias para uma mídia mais diversa e plural e a defesa da própria democracia em um Brasil ainda conflagrado.

Programação desta sexta

02/06 – sexta-feira, às 9h – Redes digitais, fake news e a regulação das plataformas

Nina Santos – Coordenadora do *desinformante, pesquisadora no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD) e diretora da Aláfia Lab

João Brant – Secretário de Políticas Digitais da SECOM/Presidência da República do Brasil.

Orlando Silva – deputado e relator da PL das fake news (PL 2630)

• 02/06 – sexta-feira, às 14 horas – As prioridades da comunicação pública

Guia Dantas – Assessora Especial de Comunicação do Rio Grande do Norte

André Curvello – Secretário de Comunicação da Bahia

Hélio Doyle – presidente da Empresa Brasil de Comunicação (EBC)