Por Victor Razoni – Foto Victor Razoni

A equipe do Notícias da Bahia entrevistou o jornalista Nestor Mendes Júnior, autor do livro “Bahêa, Minha Paixão – Primeiro Campeão do Brasil”. Durante a conversa, Nestor compartilhou sua paixão pelo Tricolor de Aço e explicou como surgiu a ideia de escrever sobre o Bahia.

O escritor nasceu em São Sebastião do Passé, Bahia, em 27 de novembro de 1962. Formado em Jornalismo, pela Universidade Federal da Bahia, e em Direito, pela Universidade Católica do Salvador, trabalhou em diversos veículos de comunicação da Bahia, como A Tarde, TV Bahia, Tribuna da Bahia, Correio da Bahia, Bahia Hoje, Rádio Sociedade, Rádio Educadora e como repórter free lancer do Jornal do Brasil. Já autuou no marketing político de 18 campanhas eleitorais.

Nestor também escreveu os livros “Bahia Esporte Clube da Felicidade – 70 Anos de Glórias” (2001) e “Nunca Mais! – 25 anos de Luta pela Liberdade no Esporte Clube Bahia” (2014).

Confira a entrevista:

Onde surgiu essa paixão que você têm pelo Esporte Clube Bahia?

Olha, a história começa, geralmente já menino. Quando começa essas coisas de futebol. Jogava bola e meu pai era torcedor do Bahia. A gente morava no interior, em São Sebastião do Passé e toda segunda-feira tinha jornal, todos os dias tinha jornal em casa e segunda-feira você lia o caderno de esporte e o Bahia ganhando. E aí começou essa história de ser apaixonado pelo Bahia. A primeira vez que eu vim na Fonte Nova. Eu tinha mais ou menos 10 anos. Era em 72. E aí, fiquei deslumbrado e apaixonado. Menino… Minha mãe tinha um crucifixo de prata com um fundo de madeira e aí eu pegava esse crucifixo e botava no peito rezando para o Bahia ganhar aqueles campeonatos brasileiros intermináveis contra o Nacional, Botafogo da Paraíba, ABC, nos campeonatos que tinham quase uma centena de clubes, até centenas de clubes, campeonatos intermináveis. E aí foi essa essa coisa da paixão do futebol, de gostar do futebol, de jogar bola também, e a paixão pelo Bahia. E aí o deslumbramento da primeira vez que eu fui na Fonte Nova e fiquei realmente apaixonado.

O que motivou você a fazer os livros sobre o Bahia?

Eu jogava, mas eu tinha uma miopia altíssima de 14 graus, era meio cegueta. Meio não, era totalmente cegueta. Então imagine jogando bola, furava, chutava errado, essas coisas todas. Depois eu coloquei lente de contato e já depois um pouco adulto eu fiz a cirurgia, a cirurgia refrativa. E aí, passei a ser um bom zagueiro de fato, mas já estava em fim de carreira e não podia mais contribuir para ser jogador do Bahia. Então aí eu fui escrever coisa que eu sempre gostei. De lei de escrever. Jornalista, por formação. Fui escrever. Tinha um livro do Bahia de 41, que era de Haroldo Maia. Tinha outro do jornalista Newton Calmon, Carlos Casais, da década de 70, final dos anos 70, na década de 70. E depois não tinha mais nada de literatura do Bahia. Aí em 2001, um pouco mais antes, mas em 2001 foi quando o livro foi lançado, mas mais ou menos uns 5 anos antes comecei o projeto do livro que saiu em 2001, que foi Bahia Esporte Clube da Felicidade que é os 70 anos de história do Bahia. Passou, a gente participou do movimento pela democracia em 2013. Em 2014, saiu ‘Nunca Mais a História de Luta Pela liberdade no Esporte Clube Bahia. E nos 90 anos, eu precisava atualizar o livro do I70, mas aí eu resolvi fazer um livro novo, né, com uma outra pegada, muito mais, com pesquisa mais aprofundada, com mais informações, que foi Bahia, minha paixão, o primeiro campeão do Brasil, que foi lançado no final de 2022, e que é o livro que conta essa história toda, desde 1921, da fundação até 2021. Então são 90 anos dessa história toda, com os campeões, com os três temporadas, né, são 90 temporadas, de 31 a 2021, ano a ano que aquilo aconteceu.

Humilde, não sei o que, a gente já jogou para escanteios, agora estamos aí esnobando, mudando inclusive essa geografia, o Bahia sempre enfrentou preconceito, enquanto ganhou contra o Santos de Pelé em 59 e o título foi ganho em 60, em 29 de março de 60, Bahia 3 a 1 no Santos do Maracanã, você percebe já essa coisa muito fechada, são muito mais vistas né, você vê que até hoje o futebol mesmo, você vê num programa de rede nacional, ainda é muito futebol do Rio de São Paulo, os outros entram meio como coadjuvantes né. Em 59 você vê muito claramente, em 88 também, né? Porque eles não aceitam, eles acham que o futebol tem que ser ali, Rio e São Paulo. Você vê que a direção da CBF a vida inteira foi Rio e São Paulo. Os torneios, antes de incluir o campeonato de 59, que é o primeiro campeonato brasileiro, você disputava torneio regional e Rio e São Paulo, que eram caracterizados como se fosse o brasileiro. 59 não, 59 entram nos clubes do sudeste, do sul, do nordeste e do norte, e do bairro centro-oeste também. Então muda um pouco a característica do que era, mas que até hoje a gente vê claramente o Bahia

No livro você destaca a importância da torcida tricolor, modesta parte, você acha que é a mais apaixonada do país?

É uma torcida diferenciada, apaixonada, sem dúvidas. Basta analisar um recorte de 2023: o Bahia ficou em último entre os classificados, os 16, e, no entanto, em média de público, é o terceiro. Isso é verdadeiramente fantástico. É importante lembrar que o estado da Bahia possui 270 municípios dos 417 que são semiáridos, o que o torna um estado economicamente limitado em termos de recursos e divisas, com uma população predominantemente de baixa renda. Mesmo diante dessa realidade, a torcida consegue encher o estádio.

Mesmo com uma campanha sofrível, o Bahia lutando para não ser rebaixado, ainda assim, está em terceiro lugar em público. É algo notável. Vale ressaltar que dificilmente será líder, talvez nunca alcance essa posição, devido ao tamanho do estádio. Na época da reconstrução da Fonte Nova, eu, para não parecer um “engenheiro de obra pronta”, fui contra. Acredito que o Bahia deveria ter um estádio com capacidade para 80 mil pessoas, pois tem uma torcida apaixonada que lota o estádio mesmo em momentos difíceis. Imagine se o Bahia estivesse disputando títulos e permanecendo no topo da tabela, ao invés de lutar contra o rebaixamento. Tenho certeza de que isso ocorrerá em algum momento, mas pode ser limitado pelo fato de termos um estádio com capacidade limitada de 50 mil pessoas.

O senhor nota uma diferença de um torcedor de lá de trás, 59, 88, com o de agora? Você acha que o de hoje é mais imediatista, quer é resultado logo?

O futebol passou por transformações significativas, tornando-se um fenômeno global. Hoje, é possível acompanhar jogos da Turquia, do Cazaquistão, além dos tradicionais campeonatos espanhóis, ingleses, franceses e italianos. Uma realidade que contrasta com o passado, quando o futebol era predominantemente local e regional. Naquela época, os confrontos eram entre os clubes da Bahia e depois você via os clubes do Brasil, quando tinha um enfrentamentos de Bahia e Flamengo ou Bahia e São Paulo. Durante um tempo eram só rádio e depois, a partir dos anos 70, tinha televisão.

Mas mesmo assim não tinha a quantidade, a oferta que você tem hoje. Então, o perfil do torcedor é mais exigente, com um conhecimento maior, ele sabe quem é quem, ele conhece os jogadores do time, hoje o nível de informações é muito maior…coisa que no passado você não tinha.

 

ivas geradas nos grupos de torcedores do Bahia durante o período de contratações.

Comparando com o passado, nota-se que o processo de contratação de jogadores, outrora menos exposto e mais surpreendente, agora se transformou em uma verdadeira saga, onde cada movimento é acompanhado com detalhes pelos torcedores. Nomes que se tornaram ícones no Bahia, como Claudio Adão vindo do Santos como reserva de Pelé ou Bobô, anteriormente na Catuense, são exemplos de jogadores que, apesar de não serem inicialmente conhecidos em âmbito nacional, se tornaram ídolos no clube, como no título de 1988. Essas mudanças ilustram como a relação entre torcedores e seus clubes evoluiu ao longo do tempo.

O projeto do grupo City ainda está no começo. O time passou uma série A complicada no ano de 2023. Você acha que essa temporada de 2024 será diferente e você acredita que o Bahia ainda pode crescer nesse projeto do City?

Eu acho que o City investiu no Bahia, não foi à toa. Eles vieram para fazer negócios, é um grupo empresarial, eles vão investir para ganhar dinheiro com o jogador, que é o que garante que você tenha lucratividade. Mas você tem que ser competitivo, tem que ganhar campeonatos, tem que se destacar, porque tem uma série de coisas, tem premiações. O Bahia foi 16º lugar, enquanto o rival de Canabrava foi o primeiro na série B, com uma premiação substancialmente inferior.

O jogador de futebol, esse esporte, que hoje é um grande negócio gera milhões ou bilhões muito rapidamente. Então, é um tipo de ativo que ele acaba criando um serie de interesses, de oportunidades pro City e pro Bahia. Acho que eles erraram em 2023, eles não tinham conhecimento do futebol do Brasileiro e agora passaram a ter. Cadu Santoro era um observador, um jogador bom da Bolívia, da Argentina, Espirito Santo… Mas não tinha conhecimento de diretor de futebol. Ele aprendeu no cargo, ser diretor se futebol é diferente de ficar sendo olheiro.

O Bahia ganhou jogos, alguns placares elásticos contra times como Coríntias, RB Bragantino e Atlético Mineiro. Perdeu, jogando bem… jogos difíceis e acabou perdendo no final do jogo, empates no final. Eu acho que tem muito a ver com a concentração, com a coisa que você coloca em campo… acho que precisa de um pouco mais de organização, acho que você tem reforços como Everton Ribeiro, o Ferreirinha, o Bahia pode dar um “up” e dar um equilíbrio no que falta.

Acho que ainda faltam laterais… o lateral é o escape. O Bahia sofreu em 2023, só passou a ter dois laterais bons, a partir de setembro. Até Gilberto chegar, o Bahia não tinha laterais, o jacaré que era improvisado no lateral… é uma diferença muito gritante, o Bahia passou praticamente 60% da temporada sem laterais. Isso faz uma diferença enorme.

Tem que ter um equilíbrio nessa área, nessa posição, porque é importante para recompor a marcação e importante para preparar o ataque. E a defesa também, algumas coisas, a gente tomou gols de cabeça, gols contra o Santos é ridículo. Acho que Rogério Seni é um bom treinador, inteligente, estudioso, capacitado e eu acho que a gente vai se arrumar para 2024.

Quais foram as principais mudanças que você tem notado do Bahia com o SAF e do Bahia sem a SAF?

São mudanças da gestão basicamente, você tem hoje um gestor que é do ramo de futebol, uma empresa multinacional, de árabes, de chineses, de norte-americanos e gestor do maior clube de futebol. E essa mudanças, eles vão trabalhar para outro negócios, para outros investimentos, podiam ter ido para outro clube, mas escolheram um clube contradição, com um história, com um time, com uma torcida apaixonada. Torcida, significa consumidor e consumidor, significa dinheiro, dinheiro para gastar na bilheteria, para comprar produtos, dinheiro para comprar tudo que deriva dessa empresa chamada futebol.

 

Então eles vieram para um lugar, para uma terra que tem nome internacional que é a Bahia, pela sua cultura, pela sua diversidade, pelo seu meio ambiente, essa terra linda. Então, tem toda uma história por traz disso. Eles não vieram brincar, eles vieram fazer negócios. Tem uma perda que é a relação direta. Você não tem mais o que se queixar, por exemplo: “devolva meu Bahia”, porque o comando está na Inglaterra, na Árabia, está em outro lugar, mas de qualquer maneira, nós continuaremos na pressão e reclamando, vaiando, porque faz parte da pressão, né? Porque a torcida do Bahia, é uma torcida muito  generosa, ás vezes , ela é passional, mas ela é passiva.

Você é a favor de todos os times virarem SAF?

SAF, é uma figura jurídica que regula especificamente essa atividade esportiva, mas que não é necessariamente sinônimo de garantia de que você vai se dar bem, por causa disso, né? Você vê o caso do Botafogo, da SAF disparado no primeiro turno, teve uma campanha irretocável, chegou no final e se entregou e caiu pelas tabela. Você tem grandes clubes do mundo que não é SAF, o Flamengo por exemplo não é SAF, mas você tem também recursos e uma serie de coisas. A figura jurídica econômica da SAF, ela te proporciona algumas facilidades do ponto de vista fiscal, do ponto de vista contável, mas a gestão continua a mesma. Você tem que ter um time bom, competitivo, para ganhar titulo, para ganhar as partidas, por exemplo, é o caso do Fortaleza, o Fortaleza virou SAF recentemente, mas antes não era e a gestão foi muito bem feita, o atlético do paranaense, não era SAF e superou o rival dele que era o Curitiba e saiu da condição de um clube médio, para um clube grande do futebol brasileiro. Ao logo dos anos fazendo investimento apostando na base, é esse tipo de ação que leva a ter resultados, a SAF ela no ponto de vista econômico e fiscal ela é facilitadora, mas n garante que você vai ser campeão por que é SAF.