Luis Nassif

Há meses, se sabia que Miller recebera uma proposta para trabalhar na Trench, Rossi & Watanabe. Na própria Procuradoria Geral da República a decisão foi encarada como uma traição ao Ministério Público Federal.

Mal formalizou sua saída do MPF, Miller participou do acordo de leniência da JBS, como advogado do grupo.

Agora, o PGR Rodrigo Janot pretende criminalizar a atuação de Miller. E, com a sutileza de um macaco em loja de louças, cria um problema enorme para o próprio MPF. Acompanhe o raciocínio.

Jogando nas duas pontas, como procurador, antes, e como advogado, depois, que crimes Miller pode ter cometido?

Opção 1 – Acesso a informações privilegiadas, não é crime. Ao advogado de defesa é facultado o acesso a todas as provas e acusações contra o réu. Pode-se condenar moralmente Miller, mas até aí não tem sinal de crime. Essa condição impede apenas o juiz de julgar, não um ex-procurador de mudar de lado e defender o réu processado. Trata-se de questão ética, mas não criminal.

Opção 2 – valer-se de conhecimento para influenciar o outro lado a tomar decisões favoráveis ao réu, que fujam do padrão conhecido.

A convicção de Janot se fixou na Opção 2.

Para tratar Miller como criminoso, Janot teria que possuir evidências fortes de que foi cometido um crime. Ou seja, de que ele se valeu dos contatos firmados ao longo da carreira para obter uma condição ilegal ou claramente favorável ao réu.

O acordo de leniência da JBS foi fechado na 1a Instância. Foi um acordo que provocou enorme estranheza no meio jurídico, especialmente nos advogados envolvidos com acordos de leniência.

Apenas uma das cláusulas valia R$ 8 bilhões. Aplicava-se a multa de R$ 10 bilhões à JBS, mas se permitiria a ela reduzir até 80% das multas aplicadas por outras instituições. Na prática, significará reduzir a multa para R$ 2 bilhões.

A tal cláusula era tão inusitada que apenas a Operação Greenfield (dos fundos de pensão aderiu); o procurador da Bulsshit (do BNDES) achou estranho e não assinou.

Se for verdadeira a acusação de que Miller se valeu de contatos pessoais internos para influenciar decisões de fora da curva, tem que haver o cúmplice interno, com poder de decisão.

O procurador que negociou o acordo foi indicado pela 5a Câmara Criminal de Combate à Corrupção do MPF. A própria 5a Câmara homologou o acordo. No mesmo dia, aliás, que rejeitou a proposta apresentada pelo procurador Ivan Marx, para arquivamento da ação penal sobre as pedaladas da Lava Jato.

E agora, como fica?

A decisão de Janot de criminalizar Miller colocou no mesmo balaio de suspeitas a 5a Câmara Criminal de Combate à Corrupção, transformando uma suspeita individual em um caso institucional.

Havia um elefante no jardim da casa de Janot. Na pressa em desalojá-lo, Janot acabou