O Brasil de Fato Ceará entrevistou a presidenta do Instituto Virtual para o Desenvolvimento Sustentável e professora associada ao Laboratório de Cartografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Raquel Souto, para falar sobre o derramamento de óleo nas praias do Nordeste que está completando um ano.

O vazamento de cinco mil toneladas de óleo foi um dos maiores desastres ambientais do litoral brasileiro. Atingiu mais de 130 municípios em 11 estados, sendo nove do Nordeste e dois no Sudeste (Rio de Janeiro e Espírito Santo). Raquel Souto explica que atualmente tem a oportunidade de falar sobre um trabalho que foi desenvolvido no ano passado como piloto, que é o mapa participativo do derrame do petróleo. Segundo ela, esse derrame ainda não acabou, continua acontecendo. Ela afirma que ainda continuam chegando manchas em algumas praias.

Sobre a extensão do alcance desse vazamento, Raquel apresenta alguns dados que são os números oficiais publicados pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) e pelo Governo Federal. “E importante falar que é difícil atingir o tamanho da extensão dos danos, do dano ambiental e do dano socioeconômico, porque na verdade, esse derrame atingiu um terço de todo o litoral brasileiro”. A costa brasileira tem um pouco mais de oito mil km, e esse evento atingiu mais de três mil km, em 1009 localidades foram encontradas manchas de petróleo.

 

Cabo de São Agostinho em Pernambuco óleo estacionado na praia mostra o tamanho do do crime ambiental nas praias do Nordeste. / Foto: Salve Maracaípe / Fotos Públicas

Raquel explica que essas localidades foram assumidas pelo IBAMA como um espaço de 100m na linha de costa nas praias, nos manguezais, bancos de corais, etc. Ela diz que o desastre também atingiu aproximadamente 300 mil trabalhadores do mar. “Esse número ainda está subestimado porque isso na verdade foram aqueles trabalhadores que têm a carteirinha de pescador, mas a gente sabe que há uma série de outros trabalhadores, mais humildes muitas vezes, ou mais isolados que dependem do mar, mas que não têm a carteirinha, então eles não estão nessa conta dos 300 mil afetados”.

Questionada sobre a resposta do governo brasileiro em relação a esse desastre Raquel avalia que “aqui no Brasil e em todo o exterior, o que mais chamou a atenção foi a lentidão. O governo negou. Simplesmente negou o problema durante 40 dias. O governo brasileiro, ele só acionou o Plano Nacional de Contingencia, que é um plano nacional para contingencia de derrame de óleos, regulamentado por lei brasileira, 40 dias depois de iniciado o desastre. Da mesma maneira agora com as queimadas. [O governo] Demora demais a reagir. Quando reage ainda reage ineficazmente”.

Para a pesquisadora, no caso do derrame, o governo não enviou Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) suficientes para as pessoas que estavam na contenção do óleo. Outro problema apontado por ela foi a falta de coordenação do Ministério do Meio Ambiente com os estados. Raquel explica que os estados são executores da lei ambiental: “o Ministério do Meio Ambiente é o grande coordenador, mas quem executa são os estados, então faltou essa coordenação também. Praticamente, quem estava enfrentando a situação na época e agora também continua ajudando as populações costeiras foram justamente as organizações não-governamentais que foram, inclusive, atacas na época, no ano passado”.

Para ela, as tomadas de decisões por parte do governo não foram proporcionais ao problema. “Foi subestimado esse problema, até hoje é subestimado. Então a reação do governo também foi assim, foi subestimando o problema”.

 

Sobre as ações de contenção para controlar o derramamento de óleo, Raquel afirma que para ela, os trabalhos das ONGs e das próprias comunidades foram fundamentais para a realização dessas inciativas. / Foto: Igor Santos / Secom / Fotos Públicas

Sobre as ações de contenção para controlar o derramamento de óleo, Raquel afirma que os trabalhos das Organizações Não Governamentais (ONGs) e das próprias comunidades foram fundamentais para a realização dessas iniciativas. “Eles desenvolveram soluções pelas próprias comunidades para conter as manchas; boias de contenção, barreiras de rede…”.

Mesmo que esse desastre tenha acontecido há um ano, Raquel explica que algumas respostas ainda não foram dadas como, por exemplo, a origem desse óleo. “Qual foi a origem desse óleo afinal? É um desrespeito com a população brasileira. Já deveria ter tido uma resposta à população sobre a origem exatamente do óleo”.

Futuro

Sobre os desafios para superar esse desastre, Raquel avalia que estão nas mãos da academia e do governo. “A parte da academia é tentar entender como aconteceu o desastre e qual é a extensão final desse dano? E dar visibilidade a isso. O outro desafio é governamental em mostrar preocupação com a situação. Se o plano tivesse sido acionado no momento certo, era pra ver se esse plano tinha funcionado. Outros pontos são: a preocupação da segurança alimentar das comunidades; ver se a cobertura do auxilio foi suficiente”.

Mapeamento

Sobre o trabalho de mapeamento das localidades que foram atingidas pelo derramamento de óleo, a pesquisadora afirma que a iniciativa ainda continua acontecendo e faz um convite para a população: “as pessoas estão convidadas a continuar enviando as fotos. Manda pra gente enviando a localidade”.

De acordo com ela, até o momento já conseguiu mapear foto de 90 localidades. “Com as fotos a gente tem esperança de ter isso um dia mapeado”. Com o mapeamento será possível saber qual foi o aspecto do óleo que chegou em todas as localidades e com as informações, será possível formular um protocolo para as próprias comunidades enfrentarem a situação. Quem quiser ajudar no mapeamento basta acessar o site e enviar a foto da localidade atingida com as informações necessárias.