Um dos sintomas mais caros da psicopatologia, quando se estuda as psicoses, é o delírio. Esse é o sintoma mais importante dessas enfermidades mentais.

Popularmente, quando dizemos que uma pessoa “está delirando”, geralmente nos referimos àquelas pessoas que estão falando coisas sem sentido ou absurdas.

O delírio é um pouco isso mesmo, mas é mais que isso. O delírio define a psicose porque é a interpretação que o psicótico faz sobre o seu entorno. No entanto, essa interpretação não condiz em nada com a realidade do mundo onde ele vive. Ou seja, o delirante fala de fato coisas absurdas ou “loucas”, acha que o mundo o persegue ou acha que uma pessoa específica é a causa de todos os problemas do mundo.

Quem já conviveu com psicótico sabe que não adianta argumentar e contrariar o que ele está dizendo. Uma das características fundamentais do delírio é a sua irredutibilidade à argumentação lógica. O pensamento delirante é forte, é definitivo, é irremovível. E é assim porque o delirante construiu o seu mundo dentro dessa realidade paralela. Esse é o seu mundo, os outros é que estão interpretando tudo errado.

Assim, em psiquiatria aprendemos que não adianta em nada tentar “tirar” dos psicóticos aquelas “ideias malucas”. Aquele é o mundo dele! Ele não pode abrir mão daquelas idéeias sob pena de não saber mais explicar o seu mundo, nada mais fazer sentido na sua realidade.

Bem, talvez aqui vocês já estejam compreendendo onde quero chegar: o pensamento da extrema direita bolsonarista é em tudo semelhante ao pensamento delirante. Através do discurso do seu chefe foi se construindo, desde 2018, uma realidade paralela em que o grande perseguidor é Lula, o PT e os “comunistas”. Essas ideias são de tal modo arraigadas e tão fortemente compartilhadas que são – tal qual o delírio – irremovíveis. Não adianta argumentar, não adianta mostrar a falta de lógica do pensamento deles. Não há diálogo com delirantes.

Se o pensamento delirante de um indivíduo é forte, imagine se, hipoteticamente, ele encontra eco e aceitação em um grupo. Isso não acontecem bem com psicóticos, já que cada um tem seu mundo próprio. O grupo passa a se retro-alimentar do delírio, um do outro, e se cria todo um sistema delirante.

É isso que estamos vivendo com bolsominions que insistem em negar a cagada que fizeram.

Por isso, para sua própria saúde mental, não tente argumentar com um bolsominion. Não vai adiantar de nada.

VERA LÚCIA DO AMARAL é psiquiatra, professora universitária e doutora em educação pela UFRN.

 

Fonte: Caos Filosófico