Diversas unidades do Exército da Espanha foram mobilizadas nesta terça-feira (18/05) no enclave espanhol de Ceuta, no Norte da África, para ajudar no controle das ruas da cidade, após a chegada de quase 8 mil migrantes, a maioria marroquinos. Boa parte deles fez a travessia a nado. Um homem morreu na tentativa.

O Ministério espanhol do Interior negocia com o Marrocos a devolução dos migrantes, tendo sido realizados ao menos 2.700 retornos, e o órgão enviou 150 agentes de polícia a Ceuta a fim de acelerar o processo.

O ministro do Interior espanhol, Fernando Grande-Marlaska, prometeu que as autoridades serão “contundentes na defesa das fronteiras, adotando “todas as medidas necessárias para reverter a situação extraordinária e excepcional”.

Segundo a agência de notícias EFE, as devoluções estão ocorrendo sem qualquer formalidade. A entrada irregular de milhares de migrantes em um só dia é um fato inédito na Espanha.

O que desencadeou a crise entre Espanha e Marrocos?

Não está bem claro, uma vez que Rabat não se manifesta com clareza. O ministro marroquino de Direitos Humanos, Mostafa Ramid, criticou no Facebook o procedimento de Madri de oferecer asilo ao responsável por um grupo que trava luta armada com o governo de Marrocos.

Ao que tudo indica, a alusão é a Brahim Ghali, líder da Frente Polisário, o movimento de independência do Saara Ocidental. No começo de 2021, o governo teria aceitado o internamento do ativista num hospital espanhol, a fim de se tratar de covid-19.

O afluxo de jovens marroquinos ao enclave de Ceuta seria uma tática para pressionar no sentido da suspensão do tratamento de Ghali. Agora a Espanha reabriu um antigo processo judicial contra o chefe da Polisário.

O que teme o Marrocos?

No momento, o governo em Rabat está nervoso, por temer que o tratamento médico de Ghali possa levantar questões sobre sua soberania em relação ao Saara Ocidental. O país ganhou esperanças de reconhecimento internacional de sua soberania sobre o território depois que, em dezembro de 2020, o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarou que a apoiaria. Desse modo forçou Marrocos a estabelecer relações diplomáticas integrais com Israel.

Como se originou o conflito?

As tensões datam de 1884. No âmbito da Conferência do Congo, amplos territórios da África foram divididos entre as potências colonialistas europeias, cabendo à Espanha a zona hoje denominada Saara Ocidental. Em seguida, o Marrocos e a Mauritânia revindicaram o território. Depois que esta última renunciou a suas exigências em 1979, o Marrocos ocupou também o sul do Saara Ocidental.

O que é a Frente Polisário?

Em 1973 foi fundada a Polisário (sigla para Frente Popular de Liberación de Saguía el-Hamra y Río de Oro), cuja finalidade é a independência estatal do Saara Ocidental, formado pelos dois territórios mencionados no nome da organização.

Depois que, em meados da década de 1970, cada vez mais marroquinos se assentaram na região, em fevereiro de 1976 a Polisário proclamou a República Árabe Saariana Democrática (RASD). Pouco mais tarde começaram os confrontos armados com o Exército marroquino. A Polisário é apoiada pela Argélia, onde também vivem numerosos refugiados do Saara Ocidental, grande parte no campo de Tindouf.

Por que o Saara Ocidental é tão importante?

Devido a seus recursos minerais, o Saara Ocidental é uma região economicamente muito atraente. Suas jazidas de fosfato são as maiores do mundo: 72% das reservas conhecidas se concentram lá e no Marrocos. Antes do cessar-fogo de 1991, o Marrocos começou a construção de um muro de proteção, graças ao qual as regiões ricas em matérias primas agora se encontram em território marroquino.

Que status legal tem o Saara Ocidental?

Atualmente, a RASD é reconhecida por 50 Estados e pela União Africana, da qual faz parte desde 1984 – o que levou o Marrocos a abandonar a organização, no mesmo ano, só retornando em 2017. A república não ocupa um assento na Organização das Nações Unidas. No terceiro trimestre de 2020 o Conselho de Segurança da ONU prorrogou o mandato da Missão das Nações Unidas para a Organização de um Referendo no Saara Ocidental (Minurso).

Fonte: Deutsche Welle (DW)