#SPUTNIKEXPLICA

No momento em que se começava a discutir flexibilização da quarentena, avanço das mortes pelo coronavírus fez cidades e estados endurecerem medidas de isolamento. A Sputnik Brasil explica como está a situação do lockdown em várias partes do país.

A maior parte do Brasil está sob alguma restrição à circulação. No entanto, a despeito da advertência de especialistas, que recomendam o confinamento em vários estados, o lockdown só foi adotado em alguns lugares.

Estudo da Fiocruz, por exemplo, afirma que o bloqueio deveria ter sido adotado no Rio de Janeiro, pois os leitos de UTI disponíveis não seriam suficientes para atender a demanda causada pelos pacientes com COVID-19.

Além disso, o Comitê Científico do Consórcio do Nordeste sugeriu o lockdown em locais da região com ocupação de leitos superior a 80%.

“Estamos lidando com uma doença que era desconhecida, sem terapia, tratamento e intervenção eficazes, principalmente nos casos graves. As únicas medidas que a gente pode tomar são aquelas que visam impedir a disseminação do vírus. É por isso que decretar o lockdown se apresenta como uma alternativa interessante. Algumas alternativas discutidas, como isolar só grupos de risco, não são validadas cientificamente e não têm eficácia garantida”, disse à Sputnik Brasil Rômulo Neris, virologista pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador visitante da Universidade da Califórnia.

Mas a decisão de implementar o lockdown não é apenas sanitária. É também política. No Rio, o Ministério Público pediu a adoção do confinamento. O governador Wilson Witzel (PSC), no entanto, não acatou a recomendação, embora tenha prorrogado a quarentena até 31 de abril e liberado os municípios a decidir o que fazer.

Pelo menos 25 cidades brasileiras estão em lockdown

Niterói, apontada como exemplo no combate à COVID-19, por adotar desde o início da epidemia isolamento social rígido, iniciou o lockdown na segunda-feira (11). No estado do Rio, mais um município implementou o bloqueio, também no dia 11: São Gonçalo. Em ambas as cidades as regras valem pelo menos até sexta-feira (15).

Guardas municipais fiscalizam movimentação de pessoas na praia de Icaraí, em Niterói, que decretou lockdown na segunda-feira (11)
© FOLHAPRESS / AGÊNCIA F8
Guardas municipais fiscalizam movimentação de pessoas na praia de Icaraí, em Niterói, que decretou lockdown na segunda-feira (11)

No Pará, o confinamento foi iniciado no dia 7 de abril, em Belém, Ananindeua, Marituba, Benevides, Santa Bárbara do Pará, Santa Izabel do Pará, Castanhal, Santo Antônio do Tauá, Vigia de Nazaré e Breves. O bloqueio vale pelo menos até domingo (17).

O governo de Pernambuco não usou o termo lockdown, mas determinou endurecimento da quarentena na segunda-feira (11), com proibição da circulação das pessoas em Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, Camaragibe e São Lourenço da Mata. As medidas têm duração de 15 dias.

Noronha, único bloqueio que já terminou no país

No estado há ainda o único caso de lockdown que começou e já foi encerrado no país: o arquipélago de Fernando de Noronha, que iniciou bloqueio em 20 de abril e terminou no dia 10 de maio, após os 28 pacientes com COVID-19 no conjunto de ilhas serem considerados curados. Apesar disso, medidas restritivas ainda vigoram.

O primeiro local a implementar o bloqueio foi o Maranhão, em 5 de maio, em São Luís e em Paço do Lumiar, São José de Ribamar e Raposa, todas na região metropolitana da capital.

A Justiça pediu lockdown após estudo da Fiocruz apontar que o Maranhão é o estado com maior ritmo de crescimento no número de mortos por COVID-19 no país. As medidas estão em vigor até sexta-feira (15), mas podem ser prorrogadas.

Em Fortaleza, o lockdown teve inicio no dia 8 de maio e vai até o dia 20. O Ceará é o terceiro estado com maior número de casos da COVID-19 no Brasil, a maior parte deles na capital.

Praia do Futuro, uma das mais frequentadas pelos moradores de Fortaleza (CE) nos finais de semana, completamente vazia no domingo (10) do Dia das Mães em função das medidas de quarentena adotadas na cidade
© FOLHAPRESS / JARBAS OLIVEIRA
Praia do Futuro, uma das mais frequentadas em Fortaleza (CE), completamente vazia no domingo (10), Dia das Mães, em função das medidas de quarentena adotadas na cidade

O confinamento também foi adotado em Tefé, no Amazonas, após a Justiça acolher pedido da Defensoria Pública. O lockdown entrou em vigor no dia 7 de maio e vai até sexta-feira (15). O Ministério Público chegou a pedir a adoção do bloqueio em todo o estado, mas, nesse caso, a Justiça negou.

Após surto da COVID-19 em frigorífico, o município de Guia Lopes da Laguna, em Mato Grosso do Sul, decretou restrições rígidas para a circulação no dia 7 de abril. Em Minas Gerais, a prefeitura de Barbacena determinou lockdown na região central da cidade.

No município do Rio de Janeiro não há lockdown, mas o prefeito Marcello Crivella proibiu a circulação de pessoas em algumas localidades da Zona Oeste. Na cidade de São Paulo, o confinamento não foi adotado, mas um rodízio de veículos entrou em vigor na segunda-feira (11). Diante da taxa de contaminação no estado, o governo local trabalha com a possibilidade de lockdown.

Sem isolamento, ‘número de casos seria maior’

No Piauí, o governador Wellington Dias proibiu a venda de bebidas alcoólicas no estado, de sexta-feira (15) até domingo (17). Além disso, ônibus intermunicipais não circularão e as divisas do estado ficarão fechadas. O governo não usa o termo lockdown.

“Se não tivéssemos essas medidas, provavelmente o número de casos seria bem maior. O vírus é fácil de ser transmitido. Quanto mais cedo for implementado o lockdown, mais significativa a redução dos casos. Outra coisa que ele promove é o achatamento da curva, o atraso no tempo que se leva para saturar a máquina de saúde”, afirmou Neris.

No distanciamento social há apenas a recomendação para as pessoas ficarem em casa. O fechamento do comércio depende de decretos locais. No lockdown, há restrição severa para a circulação de pessoas, com controle de movimentação, bloqueio de ruas e até mesmo multas. Somente serviços essenciais podem funcionar, e para sair às ruas é preciso ter uma justificativa, como realizar compras ou buscar atendimento de saúde.

No Brasil, o isolamento social se tornou uma batalha política. O presidente Jair Bolsonaro e apoiadores, assim como alguns empresários, pedem a flexibilização das medidas restritivas. De acordo com esse grupo, é preciso abrir a economia para evitar a recessão econômica.

Manifestantes bolsonaristas participam de protesto contra as medidas de isolamento social, em Brasília, 3 de maio de 2020
© REUTERS / UESLEI MARCELINO
Manifestantes bolsonaristas participam de protesto contra as medidas de isolamento social, em Brasília, 3 de maio de 2020

No dia 7 de maio, Bolsonaro foi caminhando até o Supremo Tribunal Federal (STF), ao lado de representantes de setores da economia, pedir o relaxamento da quarentena. Segundo a Corte, é competência dos executivos estaduais e municipais, e não do governo federal, deliberar sobre a restrição à circulação.

Por outro lado, a maioria dos especialistas defende o distanciamento ou o lockdown, sendo acompanhados por boa parte dos prefeitos e governadores.

A briga foi parar na Justiça, que determinou o lockdown em várias cidades. Além disso, houve a suspensão da flexibilização do isolamento em alguns locais. No Distrito Federal, por exemplo, a Justiça impediu a abertura do comércio prevista para segunda-feira (11).

Tratamento de ‘choque’ para ‘soltar aos poucos’

Casos semelhantes ocorreram em Sorocaba, Diadema e São José dos Campos, em São Paulo. Em contrapartida, em Tupã, também em São Paulo, a Justiça manteve a flexibilização, assim como ocorreu em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro.

Para o economista e professor da UFRJ Ricardo Summa, é impossível o isolamento não ter efeitos sobre a economia. “A demanda de alguns setores evaporou de uma hora para outra, como, por exemplo, bares e restaurantes”, disse à Sputnik Brasil.

Ele afirma que os efeitos econômicos serão sentidos mesmo depois do fim da quarentena. “Isso está ocorrendo em lugares como a China. A demanda não voltou como era, e não vai voltar tão cedo, enquanto o vírus circular. As pessoas vão menos aos restaurantes e às lojas”, argumentou.

Apesar disso, Summa considera a melhor estratégia para mitigar a queda na economia um tratamento de “choque” para combater a disseminação do coronavírus, com “medidas drásticas” de isolamento, para depois “ir soltando aos poucos” as atividades.

“Caso contrário, a epidemia vai se estendendo e vai adiando a retomada”, disse.