© Foto / Marcos Correa / Presidência da República
Sputnik – “Determinei o fortalecimento dos órgãos ambientais do governo”, afirmou Jair Bolsonaro durante seu discurso na Cúpula do Clima nesta quinta-feira (22).
No entanto, há uma diferença entre o que Bolsonaro fala o que se vê de ações tomadas pelo governo federal. É o que destaca Helena Margarido Moreira, professora de relações internacionais e pesquisadora de política ambiental global, em entrevista à Sputnik Brasil nesta quinta-feira (22).
Nesta semana, mais de 600 servidores do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) publicaram uma carta aberta em que afirmam que “todo o processo de fiscalização e apuração de infrações ambientais encontra-se comprometido e paralisado”. Segundo o documento, a paralisação se deve à nova instrução de não lavrar multa diante de determinados crimes ambientais, mas sim “emitir um relatório”.
Também nesta semana, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles – que esteve ao lado de Bolsonaro durante o discurso desta quinta-feira (22) – foi denunciado pelo superintendente da Polícia Federal (PF) no Amazonas, Alexandre Saraiva. Em notícia-crime enviada ao Supremo Tribunal Federal, a PF aponta a possibilidade do envolvimento de Salles nos crimes de advocacia administrativa, organização criminosa e o crime de dificultar a ação de fiscalização ambiental.
“Que compromisso brasileiro é esse de fortalecer órgãos ambientais enquanto internamento a gente vê desde o início do governo Bolsonaro o contrário, uma política de desmonte destes órgãos?”, questiona a internacionalista.
Durante o discurso, Bolsonaro reforçou também a dificuldade financeira do Brasil diante das metas estipuladas e voltou a convocar doações da comunidade internacional para ajudar o país. Segundo Bolsonaro, o Brasil merece uma “justa remuneração pelos serviços ambientais prestados”
“É importante destacar que estes serviços ambientais não foram prestados durante o governo Bolsonaro, que sucessivamente alcança recordes de taxas de desmatamento dos biomas brasileiros”, afirma Moreira.
‘O governo precisa resolver quais vão ser de fato as metas brasileiras’
O presidente falou nesta quinta-feira (22) em zerar o desmatamento ilegal ate 2030 e em alcançar a neutralidade na emissão de gases até 2050. A última meta, no entanto, não está presente na NDC mais recente publicada pelo Brasil.
“Isso não tinha aparecido em nenhum discurso do Governo Bolsonaro antes, […] então precisa ficar mais claro como o governo brasileiro espera alcançar esta neutralidade ate 2050. […] O governo precisa resolver quais vão ser de fato as metas brasileiras, se é o que foi apresentado para a Convenção do Clima em dezembro ou o que Bolsonaro apresentou agora”, diz a especialista.
Enquanto o Brasil reforça que não é um dos países mais poluentes do mundo e que, portanto, não precisa adotar as medidas mais rígidas, outros países falam em multilateralismo e em cooperação internacional. Posturas como estas acabam por isolar o país cada vez mais na comunidade global.
“O Brasil foi o 21º a falar, e Bolsonaro discursou em um momento em que Biden não estava na sala. Isso tem uma representação em termos diplomáticos”, destaca Moreira.
Diplomacia defasada
A especialista ressalta que, em diversos momentos, o presidente brasileiro citou metas, conquistas e posicionamentos que são anteriores a seu governo. Quando Bolsonaro fala em metas absolutas que o Brasil adota para todos os setores da economia, na verdade se refere à primeira Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) do Brasil, publicada sob a administração da ministra do meio ambiente Izabella Teixeira, em 2015, no governo Dilma.
Jair Bolsonaro ainda não se refere em nenhum momento durante seu discurso ao desenvolvimento sustentável – fala apenas em “direito ao desenvolvimento”.
“O direito ao desenvolvimento era uma defesa da diplomacia brasileira adotada durante a conferencia sobre meio ambiente em Estocolmo em 1972. Em 92 já era uma postura diferente, falando em desenvolvimento sustentável”, explica Moreira.
Cúpula de Líderes sobre o Clima.
Discurso menos combativo, porém sem grandes novidades
Moreira avalia que o discurso de Bolsonaro traz um tom “menos combativo” do que vinha sendo empregado até então. No entanto, não traz grandes novidades sobre a política e as metas ambientais brasileiras.
O Brasil segue sendo alvo de críticas pela última revisão do NDC, quando o Brasil atualizou o ano base o cálculo de suas metas ambientais. Como resultado, o Brasil na verdade se permitiu emitir uma quantidade maior de gases poluentes.
“Havia uma expectativa que o Brasil revisasse novamente sua NDC, mas isso não aconteceu”, diz Moreira.