O triticale acaba de entrar para a base de dados do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC), com a indicação de cultivo nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste do Brasil, em sistema de sequeiro e irrigado. O zoneamento vai orientar a expansão do cultivo do triticale no País voltada às oportunidades no crescimento da demanda de uso desse cereal na alimentação animal.

O triticale é um produto direto da pesquisa, gerado a partir do cruzamento do trigo com o centeio. Nesse cruzamento, o triticale herdou das espécies parentais características favoráveis, como potencial de rendimento de grãos e de biomassa, resistência a doenças, bom desenvolvimento em baixas temperaturas, tolerância à seca, sistema radicular profundo e grãos de alto valor proteico. A cultura contribui para o sistema agrícola, principalmente em semeadura direta na palha, proporcionando boa cobertura vegetal mesmo em áreas com baixa fertilidade e em solos arenosos. O triticale também apresenta boa tolerância ao estresse hídrico, a solos ácidos e permite menor custo de produção quando comparado a outros cereais.

A pesquisa de triticale no Brasil iniciou na década de 1960, quando foram introduzidas cultivares trazidas do Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo (CIMMYT), localizado no México. Na década de 1980 foram desenvolvidas as primeiras cultivares para uso comercial. A primeira cultivar de origem brasileira foi lançada pela Embrapa em 2005, garantindo melhor adaptação genética do cereal às condições brasileiras de clima e solo.

A área de triticale chegou a 136 mil hectares no início dos anos 2000 (Conab), mas problemas com doenças e baixa produtividade nos materiais importados resultaram num gradativo decréscimo da área – registrando 15 mil hectares em 2021 – afetada também por fatores como disponibilidade de insumos (falta de sementes e defensivos registrados para a cultura) e oscilações mercadológicas (preferência da indústria moageira pelo trigo e maior oferta de milho para a indústria de proteína anima). “Devido a sua rusticidade, durante muitos anos o triticale foi considerado uma cultura marginal, com o cultivo realizado com baixa tecnologia, reduzido uso de insumos como sementes, fertilizantes, fungicidas e inseticidas”, conta o pesquisador da Embrapa Trigo Alfredo do Nascimento Junior. Segundo ele, o uso de semente própria também limita o crescimento do triticale no Brasil, impactando no potencial de rendimento e com um grande número de lavouras não registradas nos levantamentos oficiais: “Nos últimos dois anos, foram inscritos no Brasil cerca de 2,8 mil hectares de campos de sementes certificadas, suficientes para serem usadas para quase 70 mil hectares de lavouras comerciais, evidenciando uma lacuna de aproximadamente 55 mil hectares, não contabilizados nos levantamentos oficiais. Se considerarmos que em pelo menos 50% das lavouras não são utilizadas sementes certificadas, é possível que existam entre 130 a 140 mil hectares efetivamente cultivados com triticale no Brasil, sendo o maior uso na composição de ração para produção de proteína animal”.

Novas fronteiras

A Embrapa Trigo está avaliando cultivares de cereais de inverno em diferentes regiões produtoras de grãos, onde o triticale é uma das alternativas que deverão compor a rede de experimentos a partir da publicação do zoneamento agrícola de risco climático. “O cultivo de triticale já acontece nos estados do RS, SC, PR e SP, em sistema de sequeiro. Para o ZARC, fizemos um aprimoramento dos dados para indicar a melhor época de cultivo nas regiões tradicionais, além de orientar a expansão da cultura para novas regiões na faixa tropical, nos estados de MG, GO, MS, MT, BA e DF, tanto no sistema de sequeiro como no irrigado”, explica o pesquisador da Embrapa Trigo Gilberto Cunha, destacando que o ZARC é baseado em séries históricas de clima, modelagem de cultivos e simulação de riscos. “Por meio de quatro variáveis – município, tipo de solo, cultura e ciclo da planta – o sistema apresenta a época do ano mais indicada para a semeadura e as taxas associadas de risco de perdas – até 20%, 30% e 40%”, conclui Cunha.

Demanda crescente

O Brasil é o 3º maior produtor mundial de carne de frango e suína, 2º de carne bovina e 6º em produção de leite. “Toda essa produção de proteína animal depende do suprimento de alimento de qualidade e o triticale está sendo utilizado em substituição parcial ao milho na ração animal e na silagem”, avalia o pesquisador da Embrapa Trigo Alfredo do Nascimento Junior.

De acordo com a pesquisadora da Embrapa Suínos e Aves, Terezinha Marisa Bertol, a composição de rações que associam milho, farelo de soja e cereais de inverno formam a dieta ideal para os animais, garantindo equilíbrio em aminoácidos, energia, proteínas e fibras. Segundo ela, o triticale apresenta elevado teor de fibras e enzimas nos grãos, além de superar o milho no teor de aminoácidos, importantes para o crescimento e o sistema imunológico de suínos e aves, como lisina, metionina e triptofano. “Verificamos a viabilidade técnica e econômica do uso do triticale para a alimentação de frangos de corte com uma equivalência em relação ao milho de 85 a 90%”, explica a pesquisadora.

Na pecuária, o triticale apresenta maior concentração de proteínas do que o milho, e pode reduzi o uso de farelo de soja na ração dos bovinos. Diversos estudos estão sendo realizados pela Embrapa em parceria com a Emater/RS, a UPF, o Senar-RS e o setor sementeiro, para avaliar a conversão alimentar do triticale e o retorno econômico no uso do cereal na pecuária de corte e de leite. Resultados iniciais mostram que 1kg de silagem de triticale pode produzir até 1,3 kg de leite, aproveitando melhor as áreas de inverno na produção de forragens e liberando espaço para o cultivo de grãos no verão.

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Serviço

O aplicativo ZARC Plantio Certo, desenvolvido pela Embrapa Agricultura Digital, está disponível nas lojas de aplicativos e permite acessar de forma prática as informações oficiais do ZARC, facilitando a orientação de adesão aos programas de política agrícola do governo federal.