A Polícia Federal (PF), subordinada ao ministro da Justiça, Sergio Moro, apura o vazamento de mensagens de Telegram do ex-juiz e de procuradores da Lava Jato, mas não investiga o conteúdo das conversas em si, se ele representa ou não um crime. Mas, segundo investigadores da própria PF e juristas ouvidos pelo UOL, a apuração deveria ser completa, como determina a legislação brasileira, já que as mensagens podem revelar crimes.

A PF no Paraná, que apura o caso de procuradores como Deltan Dallagnol e da juíza substituta Gabriela Hardt, não solicitou os telefones celulares dos mais de 15 membros do Ministério Público, que anunciaram que apagaram as mensagens. O órgão justificou à reportagem que “eventual perícia não é necessária”: “O conteúdo das mensagens não está sendo apurado; isso não é objeto da investigação”, disse a assessoria da corporação em Curitiba.

Na apuração da PF em Brasília, Moro entregou seu aparelho. A mesma atitude foi tomada por Gabriela Hardt, juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba, que cuida dos casos da operação no Paraná.

Não apurar o conteúdo das conversas e não solicitar os telefones dos procuradores está em desacordo com o Código de Processo Penal (CPP), segundo técnicos e especialistas ouvidos pela reportagem. A investigação de “fatos e circunstâncias” seria obrigatória ainda que nenhum crime seja descoberto ao final.

O artigo 5º do mesmo código informa que uma investigação da PF pode ser iniciada pelo próprio órgão “de ofício”, ou seja, por iniciativa da própria polícia. Neste caso, bastaria um delegado determinar a apuração. Questionada pelo UOL, a PF não respondeu por que não investiga as mensagens.

Já o artigo 158 do Código de Processo Penal diz que, “quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado”. Para um perito da própria PF ouvido pelo UOL sob condição de anonimato, isso significa que é impossível ignorar a busca por vestígios nos telefones celulares dos procuradores.

Um investigador da PF contou à reportagem que os delegados do caso deveriam requisitar os telefones. Mais: deveriam analisar tanto os fatos relacionados a supostos vazamentos quanto a eventuais crimes indicados nas mensagens entre Moro e os procuradores da Lava Jato.

Para o jurista Wálter Maierovitch, professor de direito da Unicamp (Universidade de Campinas), a PF deve investigar no mesmo inquérito todos os aspectos do caso. “Se o negócio for sério, a PF tem que investigar nesse inquérito a suposta ação criminosa de roubo e vazamento destas mensagens particulares, como já foi anunciado, mas também a autenticidade do material, se não foi adulterado, e por fim o teor dele”, diz o jurista. “Não tem cabimento uma investigação para cada coisa, o caso é um só”, afirma.

Para Maierovitch, caso a autenticidade seja comprovada, o teor do material já revelado é gravíssimo e ensejaria a nulidade processual de vários processos julgados por Moro mencionados na mensagem.

Para o advogado Francisco Monteiro Rocha Júnior, presidente do IBDPE (Instituto Brasileiro de Direito Penal Econômico), conversas já divulgadas em reportagens indicam a possibilidade de que o ministro Moro e procuradores da Lava Jato tenham cometido o crime de prevaricação. A prevaricação acontece quando um funcionário público atrasa ou deixa de cumprir sua função para satisfazer seu interesse.

Numa das conversas divulgadas pelo The Intercept Brasil, por exemplo, o então juiz Moro discordou de investigações da Lava Jato sobre o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) pois isso poderia “melindrar alguém cujo apoio é importante”.